sábado, 3 de agosto de 2013

PSICANALISTA



_ Boa noite. Bem, devo dizer que é estranho atender a noite. Todos esses anos como psicanalista é a primeira vez que um cliente fez questão desse horário.
_ É que sou sensível a luz do sol. Onde me sento?
O Doutor aponta para uma confortável poltrona.
_ O senhor pode deitar no sofá, se quiser. Ele se apressa em dizer.
_ Eu fico muito tempo deitado, sentado está bom, responde o cliente com uma voz grave e muito calma enquanto senta-se.
_ Então, o senhor é médico? Indaga o psicanalista.
_ Não, não. Tenho muito apresso por anatomia e biologia, mas não sou médico não.
_ Está aqui na sua ficha. A Sofia, minha secretária anotou. Dr. Cula. Achei até que era um nome muito incomum.
_ Não. O nome é Drácula. Sou um nobre de uma longa e antiga dinastia originada na Bavária.
_ Ah, Sofia da puta – o psicanalista fala quase num sussurro.
_ É a primeira vez que venho num consultório desses. Por onde começo?
O psicanalista começa a notar a pele pálida do paciente, as unhas grandes e os olhos profundos. Pensa que o caso pode ser mais sério, que ele pode ter transtornos graves.
_ O senhor pensa que é vampiro? Dispara.
_ Não diga isso! Não assim tão alto, eu tenho vergonha.
_ Vergonha de pensar que é um vampiro? Acredite, já vi casos piores. Um dos meus pacientes queria ser igual o Arnaldo Jabor.
_ Eu sou um Vampiro – disse Drácula quase desabando na poltrona – mas hoje sinto vergonha de assumir isso.
O único som que podia ser ouvido era o do lápis sobre o bloco de folha nas mãos do psicanalista.
_ E quando isso começou?
_ Com o filme crepúsculo. Eu gosto do cinema, sabe? A gente pode morder uns pescoços no escuro e ninguém nota. As vezes até assisto os filmes. Quando vi o cartaz pensei: ninguém vai achar estranho um cara que parece vampiro assistir um filme desses. O senhor entende?
O lápis continuava a percorrer o papel.
_ Então... é pra continuar, não é?
O psicanalista continuou em silêncio.
_ Certo. Bem, fui ao cinema. Comecei a ver o filme e até tive vontade de morder o pescoço da atriz que faz Bella. Aquele lance dela de manter as mesmas expressões faciais para todas as emoções me fez lembrar de uma morta-viva que namorei séculos atrás. Aí aparece o Edward. Vampiro andar de dia não é novidade, o Wesley Snipes fez isso em Blade, mas vampiro de gibi não existe, todo mundo sabe disso. O Edward não mordeu a menina, brilhava a luz do dia e o pior, aparentava ter interesse no lobisomem! Doutor, nós, os vampiros, somos seres que seduzem antes de se alimentar. Nos orgulhamos disso. Mas depois que aquele cara disse: “Eu sou perigoso, Bella”, pronto! Viramos piada. Agora sempre que mostro as presas as mulheres elas tem ataque de riso. Outras fazem pior: “Pensei que tinha saído com um macho alfa, um homem sofisticado. Não curto esses lances não” e vão embora. Eu era um garanhão, agora só tomo sangue de saquinho. O que posso fazer? Tem algum remédio, algo que me dê coragem de me assumir como Vampiro?
_ Esse lance de se assumir é complicado. Você não pode ficar se prendendo por aquilo que as pessoas vão achar. Você tem que se soltar, ser você.
_ Mas é tão difícil.
_ Ora, o senhor pode se espelhar em grandes exemplos. Veja o filme de Francis Ford Copolla, veja o Nosferatu, a hora do espanto, leia os livros de Stephen King!
_ Ok. Eu vou tentar.
O psicanalista se levanta e aponta a porta.
_ Seu tempo acabou. Mesma hora semana que vem.
_ Certo. O conde levanta e enxuga as lágrimas.
_ Só mais um coisa – diz o psicanalista – É melhor não assistir Diários de um Vampiro.


Emerson Luiz

Um comentário:

  1. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk eita resenha da peste kkkkkkkkkkkk gostei demais kkkkkkkkkkk

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