sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

EMBORA REPUDIEMOS O TERRORISMO, NÃO SOMOS TODOS CHARLIE. Conheça um perfil de revista francesa vítima de ataque terrorista que a mídia tradicional não mostra. Liberdade de expressão deve estar acompanhada por respeito e responsabilidade

CHARLIE HEBDO JÁ COMPAROU MINISTRA NEGRA A MACACA
O jornal Charlie Hebdo, vítima de um ataque terrorista essa semana em Paris, já foi condenado na França por ofender a ministra da Justiça, Christiane Taubira.
Nascida na Guiana Francesa, ela foi retratada como um macaco na capa de sua edição de 13 de novembro de 2013, com a seguinte manchete: "Esperta como um macaco, Taubira acha a banana". A ministra denunciou as declarações "de uma extrema violência" que negavam seu "pertencimento à espécie humana" e recebeu o apoio do público em geral.
O episódio agora circula na internet em meio à onda de manifestações do “Je suis Charlie”. (Fragmento de reportagem do Brasil 247)
SÁTIRA OU PRECONCEITO?
Muitas vezes fazemos esse questionamento a respeito de discursos, piadas, charges e programas televisivos. Até onde é humor e quando começa a ser falta de respeito? Em nome da liberdade de expressão, artistas e comunicadores podem agredir crenças, valores e a imagem das pessoas? 
Repudio qualquer forma de terrorismo. Não comungo com a censura. Ninguém tem o direito de tirar vidas por não concordar com opiniões ou condutas e o objetivo desse post não é apoiar o ataque nem justificar a violência praticada contra os membros da Charlie Hebdo. O que quero aqui é revolver as águas midiáticas que levem milhões em comoção a postar #todos somos charlie. Não, não somos! Embora críticos e provocadores por natureza, artistas, escritores e pensadores não estão acima do bem e do mal.
Chamar a ministra da justiça de macaca em uma capa não foi uma experiência isolada.

Na ilustração em que vemos uma charge do profeta Maomé de bruços, numa clara posição sexual se lê: "Maomé: nasce uma estrela".
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, também foi vítima da publicação semanal francesa. Sob o título "Obama quer tranquilizar o eleitorado branco", o presidente aparece ao lado de um membro da organização racista Ku Klux Klan. A Klan surgiu no século XIX, nos Estados Unidos, com o objetivo de impedir a integração dos negros na sociedade americana, mais precisamente nos estados do sul, onde o trabalho escravo foi amplamente utilizado. A Klan, além de negar direitos a população negra, prega a supremacia branca, anglo saxã e protestante (Wasp), foi oficialmente proibida mas ainda existe e conta com cerca de três mil membros oficiais e um número bem maior de apoiadores não registrados. 
Nos quadrinhos temos algo como: "Eu apresento a vocês o meu companheiro de chapa", ao que o membro da Klan pensa:"ela nunca vai funcionar".
"Mas a Charlie Hebdo já se anunciava como um jornal irresponsável", dirão alguns, ou, "Era tudo piada, provocação". Mas qual o motivo desse tipo de provocação?

A revista pode apoiar a causa homossexual. Qualquer um pode. Chegamos a um ponto onde penso ser injusto a quem quer que seja definir como uma pessoa deve ser feliz em sua sexualidade, impondo regras morais que negam direitos civis aqueles que possuem orientações sexuais diferentes. Mas ser a favor de uma ideia, de um ideal, não dá a ninguém o direito de ser violento com aqueles que pensam de forma diferente em alguns pontos.
É nesse ponto que devemos ser guiados pela ética, a busca do sumo bem, a defesa da vida em plenitude (numa definição raramente usada hoje em dia). A Charlie Hebdo, em nome da provocação, a abandonou muitas vezes. Maomé era o alvo preferencial da revista, mas não o único. Religiosos, imigrantes, negros, políticos, todos eram vítimas dessa "violência criativa". Hoje todos querem ser Charlie, ou melhor, são levados a desejarem ser Charlie pela comoção. Um crime bárbaro, sem justificativas.
Que os membros da revista fossem questionados intelectualmente, expostos em seus erros de forma sensata e não assassinados num espetáculo de intolerância praticada em um grau muito maior do que a revista perpetrava em suas publicações.
Repudio o terrorismo e a ideia de que aquelas pessoas tiveram o que mereciam porque "com Deus não se brinca". Foi esse sentimento que produziu o atentado. Mas também repudio a intolerância religiosa, o preconceito com imigrantes e a falta de respeito com tudo o que é diferente da cultura em que estou estabelecido.
Sendo assim, eu não posso ser Charlie.

Emerson Luiz



2 comentários:

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