domingo, 3 de março de 2013

Crônica - Paisagens da Seca




Foi na estrada que o encontrei.

Retornando a cidade de Pesqueira pela BR 232 deixei meus olhos se perderem na paisagem. A seca castiga a todos com furor. Do interior do veículo em que me encontrava com minha esposa e mais seis passageiros, avistei o solo árido e sem vida, a caatinga tortuosa a anunciar que para passar por esses dias os homens e os animais devem ser tão fortes quanto ela, guardar o seu melhor em seu interior e resistir a crueldade imposta pelo calor, pela falta d’água e pelos parasitas da estiagem.

O carro pipa reina absoluto. Políticos e lideranças procuram ajudar os outros na medida que essas atitudes os ajudam a serem lembrados e valorizados. Os jornais dão mais visibilidade a copa do mundo e o crescimento econômico que ao drama do Nordeste. Essa semana o corte de cabelo de Neymar ganhou mais destaque que o rebanho dizimado, as barragens secas e o sofrimento de milhares de famílias.

Marina Silva está criando um novo partido. Eduardo Campos está ampliando seu partido. Lula e Dilma celebram o governo do seu partido e nosso entendimento continua partido. Mendigamos o que deveria ser nosso direito sagrado e inalienável: viver com dignidade!

A indústria de seca alimenta os urubus. Sejam os que voam e devoram a carniça magra dos animais caídos na beira das estradas, sejam os que lucram com a miséria do povo e rezam para que a chuva se demore mais um pouco. Afinal, um povo mantido na miséria é passível de ser explorado, alienado e facilmente controlado.

E enquanto procurava vislumbrar o horizonte ele me encontrou. Mesmo que não tenha tido consciência do nosso encontro, sua imagem me acompanhou durante toda a semana e ainda se faz presente enquanto escrevo. Um velho senhor, sentado numa colcheia vazia, no centro de um curral sem rebanho. De cabeça baixa ele alisava os tijolos como quem lamenta pela saudade que corrói o coração e tira toda a esperança. Ali antes havia um rebanho, o fruto do trabalho de uma vida. Agora havia apenas a lembrança. O que ele estaria pensando? Qual súplica silenciosa seu coração fazia ao criador? Nunca saberei.

A única coisa que posso saber é que a seca nunca nos abandonará. A estiagem passará, a chuva mais cedo ou mais tarde irá encher nossos reservatórios e colorir de verde nossas serras, brejos, ribeiras e com isso irá pintar as cores da alegria em nossas faces uma vez mais. Mas ela irá retornar, como tem feito desde que o Nordeste é Nordeste e o Sertão é Sertão.

Gostaria de dizer que não mais verei homens naquela situação. Mas para isso é necessário muito mais que uma vontade individual. É necessário que aprendamos a conviver em harmonia com a Mãe Terra. Que respeitemos seus limites, que prezemos pelo bem-viver e que o desejo pela qualidade de vida supere o desejo de ter e consumir sem medidas. É necessário preservar nascentes, cuidar da nossa casa-planeta e combater os parasitas. Os que voam, os que andam e os que se arvoram em líderes e privam da vida e acabam com os sonhos.

Emerson Luiz

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