sábado, 17 de setembro de 2011

Crônica - O menino da bicicleta vermelha.


Sete e quinze da manhã. Estou próximo a uma das escolas estaduais em que trabalho. Ando apressado e tentando organizar algumas ideias. 

Quando atravesso a rua me deparo com ele. Não deve ter mais de 11 anos de idade. É pequeno, bem mais do que devia. Cabelos loiros e oleosos, olhos tristes para qualquer criança. Ele pedala numa bicicleta vermelha repleta de ferrugem, uma Monark, acho. Ele tem de se colocar em pé para impulsionar os pedais com o peso do seu corpo. Segura o guidão apenas com uma mão, a outra segura um pedaço de pão. A garupa da bicicleta tem uma caixa de madeira presa por fitas velhas e sujas.

O menino da bicicleta vermelha passou rapidamente, mas permaneceu muito tempo em minha lembrança. Não sei quem ele é, mas fui levado por ele a refletir sobre o mundo em que vivemos e a respeito da sociedade que estamos construindo. Não posso dizer que estamos no caminho certo se ainda existem crianças que trabalham quando deveriam estar na escola. Não posso sentar-me no trono de minha sala em frente a tv e iludir-me com humorísticos enquanto ainda existem pessoas que vivem em precárias condições, quando crianças ainda são obrigadas a amadurecer cedo demais e tem seus sonhos roubados enquanto outros usufruem de cada uma de suas gotas de lágrima e de suor.

Somos mais do que nossos empregos. A quantia em nossas carteiras não é suficiente para decretar o nosso valor. Sua abundância ou falta jamais será parâmetro de caráter ou de felicidade, mas há coisas que devem ser ofertadas a cada uma de nossas crianças: um bom lar, uma boa escola e oportunidades de desenvolvimento material e espiritual.  O menino da bicicleta vermelha me fez repetir uma prece que há muito não fazia:

"Dá-me, Senhor, força e coragem para mudar tudo aquilo que posso e é preciso transformar. Dá-me ainda mais força e coragem para entender o que não posso mudar ou transformar e serenidade para distinguir entre todas as coisas".

Antes de entrar na escola olhei para trás e fiz uma prece pelo menino da bicicleta vermelha. Quando entrei lembre de que Deus nos chama a colaborar com sua obra e vi que apenas rezar não adiantava. Repeti a prece e as palavras ganharam outro sentido, precisavam de mais alguns verbos: ver, julgar, amar e agir.

Que saibamos ver os outros como pessoas, julgar as realidades injustas, amar os fracos, humildes e excluídos pelo simples fato de serem como são e agir para transformar as realidades, contribuindo para a construção de uma sociedade mais humana e fraterna.

Se um dia encontrar com o menino da bicicleta vermelha tente sorrir para ele e, quem sabe, você possa se encantar com o milagre que é o amor retribuído por uma criança. E quando ele for embora, pense que podemos fazer algo para que ele e tantos outros possam sorrir sempre.

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